Gabriela Pércio – Advogada e consultora em licitações e contratos administrativos. Mestre em Gestão de Políticas Públicas. Sócia na GVP Parcerias Governamentais.
Renila Bragagnolli – Mestranda em Direito Administrativo e Administração Pública pela Universidade de Buenos Aires Especialização em Políticas Públicas, Gestão e Controle da Administração pelo IDP/DF. Advogada de empresa pública federal.
Introdução
A revisão da ata para o fim de elevar os preços registrados em decorrência da aplicação da Teoria da Imprevisão há muito se encontra no centro de uma batalha de argumentos, notadamente entre a Administração Pública e o setor privado. De um lado, os que entendem pela impossibilidade, já que ata não é contrato; de outro, os que entendem pela possibilidade, considerando a garantia constitucional de manutenção das condições efetivas da proposta.
O cenário descortinado pela pandemia COVID-19 revolveu as discussões, trazendo à tona, novamente, posicionamentos favoráveis[1], a despeito do amplamente conhecido entendimento da Advocacia-Geral da União em sentido contrário.[2]
Diante da possibilidade iminente do novo marco regulatório para as licitações e contratos administrativos, a previsão contida no texto do PL nº 4.253/20 propicia, mais uma vez, o debate sobre o assunto:
Art. 81. O edital de licitação para registro de preços observará as regras gerais desta Lei e deverá dispor sobre: […]
VI – as condições para alteração de preços registrados;
O objetivo do presente artigo é revisitar o tema considerando o cenário possível, criado pela norma que integra a provável nova lei de licitações e contratos brasileira.
Da interpretação contrária à revisão da SRP, para elevar o preço registrado
Ao menos em três oportunidades, a Advocacia-Geral da União manifestou entendimento no sentido de que não cabe reajuste, repactuação ou revisão/equilíbrio econômico para majorar os preços registrados.[3] O fundamento estaria no fato de que esses institutos estão relacionados à contratação (contrato administrativo em sentido amplo), de maneira que o fato gerador de manutenção do equilíbrio econômico (reajuste, repactuação ou reequilíbrio econômico) deve ser reconhecido pela autoridade competente no âmbito da relação contratual firmada, sem necessária interferência na Ata de registro de preços. Assim, as situações de reequilíbrio econômico-financeiro, quando necessárias, devem ser formalizadas no contrato. [4] Esse entendimento não encontra oposição na jurisprudência do Tribunal de Contas da União, tendo passado, então, a orientar a quase totalidade dos órgãos e entidades, independentemente da esfera de governo a que pertençam.[5]
Da mesma forma, para a Administração Pública federal, argui-se a ausência de amparo legal[6] em razão das previsões contidas no Decreto federal nº 7.892/13[7], especialmente seu art. 19. Teria, o Poder Executivo federal, por meio da regulamentação, realizado sua opção de atualização de valor, em consonância com o art. 15, §3º, inc. II da Lei 8.666.[8]
Sobre as disposições do referido Decreto, a falta de clareza, evidentemente, prejudicou a interpretação favorável ao reequilíbrio, levando parte da doutrina a afirmar, razoavelmente, que o choque entre as disposições do art. 17 e do art. 19 se resolve a favor deste.[9]
Há, portanto, sólido entendimento no sentido de não ser possível a concessão de reequilíbrio econômico-financeiro pela via da revisão, para majorar os valores registrados em ata de SRP, qualquer que seja a situação/ocorrência de fatos inesperados.
Da interpretação favorável à revisão da SRP, para elevar o preço registrado
De outra banda, importantes autores defendem a possibilidade jurídica de conceder reequilíbrio econômico-financeiro pela via da revisão, para majorar os valores registrados em ata de SRP, entendimento com o qual nos alinhamos.[10]
Com efeito, o direito à manutenção das condições efetivas da proposta está garantido ao contratante privado no inc. XXI do art. 37 da Constituição Federal de 1988, trazendo, a Lei nº 8.666/93, a hipótese de modificação consensual do contrato para rever seus valores em decorrência da aplicação da teoria da imprevisão.[11]
Contudo, a circunscrição da disciplina legal ao reequilíbrio unicamente dos contratos não exclui a possibilidade jurídica de aplicação do instituto à ata de registro de preços, instrumento que também obriga o particular, durante toda a sua vigência, a manter o preço ofertado na licitação.[12] À luz das normas constitucionais, não é defensável que, havendo a concretização de circunstância previstas na Lei como autorizadora da revisão contratual em razão do impacto produzido na prestação a ser cumprida pelo particular, seja-lhe imposto celebrar o contrato sem a correspondente recomposição, ante a mera promessa de futura concessão, submetendo-se ao risco de ver sua pretensão insatisfeita em decorrência de divergências de entendimento ou mesmo, com o devido respeito, da eventual incapacidade daqueles que realizarão a análise concreta.[13] Ou, alternativamente, abrir mão do negócio, mediante a “liberação do compromisso”, apesar de ter, legitimamente, se sagrado vencedor da licitação e estar disposto a cumpri-lo.
Por outro lado, para a Administração, a revisão do preço registrado pode, em certas hipóteses, mostrar-se a melhor ou mesmo a única alternativa, sem que isso comprometa as características da ata enquanto documento que serve, simultaneamente, a diversos participantes, em distintas situações. Enquanto a liberação do fornecedor ou a extinção do registro de preços pode ser sinônimo de ineficiência e ineficácia diante de uma nova licitação que resulte em preços mais elevados, o reequilíbrio da ata melhora a performance do sistema de registro de preços, pois evita a perda do interesse por parte dos fornecedores e elimina custos transacionais relacionados à realização de diversos procedimentos de reequilíbrio pelos participantes, decorrentes do mesmo fato gerador, estendendo, ainda, seus efeitos aos casos de adesão, sem qualquer prejuízo que se possa argumentar em seu desfavor.[14] Portanto, havendo possibilidade jurídica de revisão da ata, como ora se defende, cabe à autoridade competente permitir, ou não, que sua concessão seja avaliada in concreto, ou seja, conforme as configurações do sistema de registro de preços em questão[15].
Nessa exata linha, o PL nº 4.253/20 prevê que o edital de licitação para registro de preços deverá dispor sobre as condições para alteração de preços registrados. Além de eliminar dúvidas quanto à inexistência, a priori e em tese, de obstáculo jurídico à revisão da ata, confere à Administração o poder de disciplinar o tema considerando as características do objeto e das futuras contratações decorrentes do específico registro de preços a ser implementado. Permite, acertadamente, que a decisão seja tomada com base em condições materiais, não formais, alinhando-se perfeitamente ao consequencialismo presente na LINDB.
Vindo, o PL, a converter-se em lei e sendo mantido o dispositivo ora analisado, o próprio edital da licitação poderá disciplinar o assunto, sem que seja necessário fazê-lo, antes, por meio de regulamento. Em última análise, os entes federativos poderão disciplinar livremente em seus regulamentos sobre o reequilíbrio econômico-financeiro dos preços registrados, podendo, inclusive deixar a critério do edital a definição.[16]
Em relação ao vigente Decreto federal nº 7.892/13, ou melhor, à eventual opção do Poder Executivo federal de não promover o reequilíbrio econômico-financeiro da ata quando isso elevar os preços registrados, conforme interpreta parte da doutrina, não é, como se percebe, incompatível com a redação do PL nº 4.253/20, nem o será, portanto, em relação à lei vindoura. Porém, sua manutenção, além de permanecer sob as pesadas críticas já existentes, será, evidentemente, uma posição retrógrada em face de um texto normativo mais atual.
Da análise necessária à concessão da revisão para majorar o valor registrado em ata
É cediço que o direito ao reequilíbrio econômico-financeiro do contrato surge com a ocorrência do fato gerador após a apresentação da proposta, formalizada ou não a contratação correspondente, sendo indispensável, todavia, a pertinência e a repercussão econômica do referido fato gerador nas condições de sua execução.[17]
Como bem assinala o Tribunal de Contas da União, a Teoria da Imprevisão prestigia a segurança contratual para impedir o absurdo de uma aplicação irrestrita do princípio da irretratabilidade das convenções, atenuando a responsabilidade do devedor quando sobrevir circunstância imprevisível, que altere a base econômica objetiva do contrato e gere onerosidade excessiva para uma parte e benefício exagerado para a outra.[18] Portanto, tal circunstância deve estar objetivamente clara no processo.
É indispensável que uma das hipóteses previstas expressamente no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei 8.666/1993, decorrentes de álea econômica extraordinária e extracontratual, seja caracterizada.[19] No PL nº 4.253/20, o dispositivo equivalente prevê que o reequilíbrio ocorrerá em “caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado.”[20]
Para que a variação seja considerada apta a ocasionar uma revisão do preço, ela deverá, então:
a) constituir-se em um fato imprevisível ou de consequências incalculáveis ao tempo da elaboração da proposta ou assinatura da ata;[21]
b) ocorrer de forma súbita, ocasionando um rompimento abrupto na equação econômico-financeira[22], “de maneira que se mantenha estável a relação entre as obrigações do contratado e a justa retribuição da Administração pelo fornecimento de bem, execução de obra ou prestação de serviço”.[23]
Não é demais acrescentar que, ainda que a situação fática ensejadora do pedido de recomposição pareça avassaladora em termos de repercussão financeira nos preços registrados em ata, a empresa deverá comprovar o aumento excessivo dos custos e a Administração, adotar os cuidados necessários para confirmar as alegações, caso não estejam suficientemente lastreadas nos documentos e informações anexados. Portanto, não basta ao detentor do preço registrado alegar o desequilíbrio com base em fatos genericamente ocorridos, sendo fundamental a comprovação dos fatos e da sua repercussão prejudicial direta no cumprimento das obrigações constantes da ata. O pedido de reequilíbrio econômico-financeiro deverá estar lastreado em documentação que comprove, de forma inequívoca, que a alteração dos custos dos insumos foi de tal ordem que tornou inviável a execução da prestação nos termos originais.
Por fim, ultimada a análise do direito à revisão, permanecerá a critério da Administração concedê-la ou, diversamente, revogar a ata (caso em que não caberá falar em aplicação de sanção à empresa), conforme critérios de conveniência e oportunidade explicitados por meio de decisão suficientemente motivada.
A hipótese de concessão da revisão apenas após a contratação
Aos que a essa corrente se filiam, lastreados essencialmente na natureza distinta entre a ata de registro de preços e o instrumento contratual, a solução viável e possível para a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos preços registrados será postergar as condições da proposta para o contrato, após sua regular e formal celebração.
A questão que se põe, contudo, é quanto a obrigar o particular detentor do preço registrado a formalizar o ajuste contratual, diante de uma negativa genérica ao seu pedido de revisão e sem análise do mérito, alegando que tal ocorrerá em sede de contrato.
Em nosso ver, não há cláusula exorbitante a respaldar tal conduta por parte da Administração. A ata de registro de preços representa um compromisso de fornecimento que, contudo, falece perante a demonstração da excessividade da superveniência de ônus excessivo ao particular. Desse modo, para preservar a higidez da ata, caberá à Administração, caso seja solicitado o reequilíbrio da ata, promover a análise do pedido e manifestar-se motivadamente sobre o cabimento ou não do pleito antes de qualquer contratação superveniente, assegurando ao particular, se devida, a revisão assim que o ajuste for formalizado. Recomenda-se, para maior transparência, que o procedimento seja regulado no edital.
Assim, com a assinatura do contrato ou, conforme o caso, a retirada do instrumento equivalente, estará inaugurado o momento para a concessão da revisão com base no o reconhecimento anterior do fato imprevisível, ou previsível, mas de circunstâncias incalculáveis que afetou a relação havida entre as partes durante a vigência da Ata de Registro de Preços.
Das obrigações do órgão gerenciador e do beneficiário da ata
Partindo, pois, da premissa de que é juridicamente possível o reequilíbrio da ata de registro de preços e de que é elementar à sua concessão que fique demonstrado no processo administrativo serem, as alegações da empresa, verossímeis e que o preço requerido está condizente com a nova realidade do mercado do objeto registrado, a rigor, há que se atuar exatamente da mesma forma caso fosse, o reequilíbrio, aplicado a um contrato. Assim:
- Deve, o fornecedor beneficiário da ata, em seu pedido formal, identificar o fato ocorrido, a conexão entre o fato e a prestação a ser executada em decorrência da ata e, ainda, as razões pelas quais a sua ocorrência torna impraticável o preço registrado, juntando documentos pertinentes e, preferencialmente, apresentando memória de cálculo, assim como demais justificativas destinadas a esclarecer aspectos eventualmente desconhecidos para a Administração, relacionados ao mercado e suas peculiaridades;[24]
- Deve, o órgão gerenciador, analisar o pedido e responde-lo de maneira fundamentada, explicitando suas razões de decidir de forma suficiente e clara, demonstrando o enquadramento da situação concreta na hipótese do art. 65, inc. II, “d” da Lei 8.666/93, solicitando parecer jurídico referente à aprovação do correspondente termo aditivo.
É imperioso que a instrução processual seja suficiente para permitir uma motivação consistente para a decisão, seja ela qual for, especialmente para permitir, no caso do reconhecimento do desequilíbrio, uma conclusão no sentido da existência de prejuízo anormal, que acarrete um ônus excessivo ao particular considerando a elevação dos custos totais da obrigação a ser cumprida. Caberá, também, demonstrar que a concessão da revisão da ata, na situação concreta, não acarretará externalidades negativas, como a elevação indevida do valor, considerando a realidade de outros participantes ou aderentes.
Conclusão
Diante de todo o exposto, são conclusões que podem, objetivamente, ser extraídas do presente artigo:
- É juridicamente possível a concessão de reequilíbrio econômico-financeiro à Ata de Registro de Preços para aumentar o valor registrado, desde que devidamente comprovada a ocorrência dos fatos ancorados na teoria da imprevisão;
- O texto do PL nº 4.235/20 corrobora essa afirmativa e, vindo a tornar-se norma, possibilitará a cada ente federativo regulamentar o tema no edital ou em regulamentos próprios;
- Em qualquer caso, compete exclusivamente à empresa solicitante comprovar os fatos alegados, o que não poderá ser feito de forma genérica, mas, sim, indicando clara e objetivamente a repercussão dos fatos na execução da prestação futura tornando-a mais onerosa;
- Não é possível obrigar o particular a assinar um contrato ou retirar o instrumento equivalente sem uma prévia decisão da Administração sobre seu pedido de reequilíbrio; diante do pedido corretamente instruído pelo contratado, a Administração, motivadamente, deverá:
- Reconhecer a existência do direito, se for o caso, analisar a situação concreta e, então, promover a revisão da ata, se esta for a opção mais conveniente e oportuna considerando o objeto e suas condições de execução;
- Reconhecer a existência do direito, se for o caso, informando ao particular, caso não seja cabível a revisão da ata por razões concretas ou por orientação do órgão de assessoramento jurídico, que a revisão será concedida na oportunidade da contratação;
- Não reconhecer a existência do direito, se for o caso, informando ao contratado seu dever de honrar com o compromisso de fornecer o objeto pelo preço registrado, sob pena de aplicação de sanção nos termos previstos no edital.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMORIM, Victor; MOTTA, Fabrício. Revisão de preços registrados em caso de elevação dos valores praticados em mercado no contexto da crise do coronavírus. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 19, n. 221, p. 9-16, maio 2020.
AZEVEDO, Rodrigo. Reequilíbrio Econômico Financeiro da Ata de Registro de Preço. Possibilidade ou Delírio?, disponível em https://rodrigoazevedoadvocacia.jusbrasil.com.br/artigos/195161016/reequilibrio-economico-financeiro-da-ata-de-registro-de-preco-possibilidade-ou-delirio, acesso em 18.1.2021
BITTENCOURT, Sidney. Licitação de Registro de Preços. Comentários ao Decreto nº 7.892/2013, de 23 de janeiro de 2013, alterado pelos Decretos nºs 8.250, de maio de 2014 e 9.488, de 30 de agosto de 2018. 5. Ed. Belo Horizonte: Fórum: 2019, p. 136/140.
CHAVES, Luiz Cláudio de Azevedo. O que muda no sistema de registro de preços para os órgãos federais e quais os impactos provocados nos demais entes: breves comentários ao decreto federal n. 7.892/2013. Registro de preços. Revista JML Licitações e Contratos Digital. JUN | 2013.
GUIMARÃES, Edgar; NIEBUHR, Joel de Menezes. Registro de preços: aspectos práticos e jurídicos. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2013. p. 103-104
Notas de rodapé
[1] A respeito, confira-se artigo AMORIM, Victor; MOTTA, Fabrício. Revisão de preços registrados em caso de elevação dos valores praticados em mercado no contexto da crise do coronavírus. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 19, n. 221, p. 9-16, maio 2020.
[2]Parecer 3/2019-DEPCONSU/AGU: “III – Consequência da natureza jurídica do preço registrado em ata como declaração receptícia de vontade e, portanto, ato anterior à formalização do ajuste, é a inaplicabilidade direta dos institutos vocacionados a garantir o equilíbrio econômico-financeiro da contratação”.
[3]O tema, contudo, já foi objeto de parecer em sentido diverso, que concluiu:
“c) Para a concessão de Reajuste de preço fixado em Ata de Registro de Preços, tendo como base o Reequilíbrio econômico-financeiro previsto no art. 65, inc. II, letra “d”, da Lei nº 8.666/93, não necessárias, a verificação de mais duas condições legais preconizadas no Decreto nº 7.892/2013;
1ª) negociação prévia com os demais fornecedores, determinado pelo art. 17, a fim de verificar se existe, observada o ordem de classificação da licitação, eventuais demais licitantes com preços registrados em relação ao mesmo produto objeto do pedido de reequilíbrio econômico-financeiro, com interesse em fornecer o produto por preço inferior ao que atualmente está sendo reivindicado pela Empresa requerente;
2ª) verificação dos preços atuais do mercado, para fins da aplicação dos artigos 18 e 19 do Decreto; Somente se as duas condições legais especiais impostas pelo Decreto nº 7.892/2013 estiverem devidamente satisfeitas (e formalmente comprovadas no processo), e for o caso, será possível conceder o reequilíbrio econômico-financeiro postulado pela empresa requerente em relação ao novo preço a ser praticado nas eventuais contratações futuras.” (Parecer nº 070/2016/SCTL/PF-IFG/AGU)
[4] Parecer nº 14/2014/CPLC/DEPCONSU/PGF/AGU, Parecer nº 00001/2016/CPLCA/CGU/AGU e Parecer nº 3/2019-DEPCONSU/AGU.
[5] Vale mencionar, contudo, precedente da Primeira Câmara durante a vigência do Decreto federal nº 3.931/01 admitindo a revisão dos preções registrados, ainda que somente “após a comprovação do desequilíbrio da equação econômico-financeira da proposta e da efetiva negociação com os demais fornecedores (Acórdão 2.861/09 – TCU/Primeira Câmara).
[6]“I. Reajuste na ata de registro de preços. Ausência de amparo legal. Os arts. 17, 18 e 19 do Decreto nº 7.892/2013 somente previram a revisão para redução dos preços aos valores de mercado com fundamento no art. 65, II, d, da Lei nº 8.666/93.
II. Cláusula com critério de reajustamento em contrato decorrente de licitação processada sob Sistema de Registro de Preços. Possibilidade, desde que obedecidos os requisitos estabelecidos para o reajuste ou para a repactuação na legislação de regência (Lei nº 8.666/1993, Lei nº 10.192/2001 e Instrução Normativa SLTI/MPOGnº 02/2008). Instrução Normativa MARE nº 08/98. Revogação tácita.
III. Possibilidade de previsão de cláusula de reajuste ou de repactuação em contrato decorrente de licitação processada sob Sistema de Registro de Preços destinado especificamente ao Regime Diferenciado de Contrações Públicas SRP/RDC (art. 37, XXI, da CF/88, arts. 32, 2º, 111, e 39 da Lei nº 12.462/2011 e arts. 8º, XII, e 94 do Decreto nº 7.581/11).(Parecer nº 14/2014/CPLC/DEPCONSU/PGF/AGU)
[7]“Art. 17. Os preços registrados poderão ser revistos em decorrência de eventual redução dos preços praticados no mercado ou de fato que eleve o custo dos serviços ou bens registrados, cabendo ao órgão gerenciador promiver as negociações junto aos fornecedores, observadas as disposições contidas na alínea “d” do inciso II do caputdo art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993.
Art. 18. Quando o preço registrado tornar-se superior ao preço praticado no mercado por motivo superveniente, o órgão gerenciador convocará os fornecedores para negociarem a redução dos preços aos valores praticados pelo mercado.
§ 1º Os fornecedores que não aceitarem reduzir seus preços aos valores praticados pelo mercado serão liberados do compromisso assumido, sem aplicação de penalidade.
§ 2º A ordem de classificação dos fornecedores que aceitarem reduzir seus preços aos valores de mercado observará a classificação original.
Art. 19. Quando o preço de mercado tornar-se superior aos preços registrados e o fornecedor não puder cumprir o compromisso, o órgão gerenciador poderá:
I – liberar o fornecedor do compromisso assumido, caso a comunicação ocorra antes do pedido de fornecimento, e sem aplicação da penalidade se confirmada a veracidade dos motivos e comprovantes apresentados; e
II – convocar os demais fornecedores para assegurar igual oportunidade de negociação.
Parágrafo único. Não havendo êxito nas negociações, o órgão gerenciador deverá proceder à revogação da ata de registro de preços, adotando as medidas cabíveis para obtenção da contratação mais vantajosa.”
[8] “III – Consequência da natureza jurídica do preço registrado em ata como declaração receptícia de vontade e, portanto, ato anterior à formalização do ajuste, é a inaplicabilidade direta dos institutos vocacionados a garantir o equilíbrio econômico-financeiro da contratação (art. 37, XXI, da CF/88).
IV – A lei nº 8.666/93 prevê “sistema de controle e atualização dos preços registrados” (Art. 15, §3º, inc. II). Coube, então, ao Decreto prever as hipóteses de atualização do valor.” (Parecer nº 3/2019-DEPCONSU/AGU).
[9] “A despeito de muitos órgãos promoverem revisões dos preços registrados, impende destacar que o instituto da revisão não cabe na Ata de Registro de Preços. Aliás, os preços da Ata só admitem variação em uma direção: para baixo. Jamais para cima. Dois elementos conduzem o intérprete nessa direção. Em primeiro lugar, não há amparo legal a subsidiar a aplicação da revisão da Ata. Nada obstante o art. 17 indicar essa possibilidade (“Os preços registrados poderão ser revistos…observadas as disposições contidas na alínea “d” do inciso II do caput do art. 65 da Lei no8.666, de 1993), o art. 19, que cuida da hipótese de o preço registrado tornar-se defasado em relação ao mercado, não prevê a revisão da Ata ou a majoração de seus preços. Dá como solução: liberar o fornecedor do compromisso; promover tratativas a fim de verificar se os demais fornecedores podem suportar o preço registrado; e, por fim, sendo infrutíferas as negociações, revogar a Ata. O conflito entre as disposições do art. 17 e do art. 19 se resolve a favor deste último.” (CHAVES, Luiz Cláudio de Azevedo. O que muda no sistema de registro de preços para os órgãos federais e quais os impactos provocados nos demais entes: breves comentários ao decreto federal n. 7.892/2013. Registro de preços. JUN | 2013. Revista JML Licitações e Contratos Digital.)
[10]Conforme ensinam Joel de Menezes Niebuhr e Edgar Guimarães, “O inciso II do § 3º do artigo 15 da Lei nº 8.666/93 prescreve que o decreto regulamentar sobre o registro de preços deve observar, obrigatoriamente, estipulação prévia do sistema de controle e atualização dos preços registrados. Portanto, a todas as luzes, os preços registrados em ata não devem ser sempre os mesmos; eles podem e devem ser revistos, desde que ocorram fatos geradores de desequilíbrio econômico-financeiro. E não poderia ser diferente, haja vista que a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro é direito de alçada constitucional, previsto no inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal – em conformidade com a passagem que prescreve que devem ser mantidas as condições efetivas da proposta. Ou seja, o preço pode ser revisto tanto para cima quanto para baixo. Se os preços praticados no mercado forem reduzidos, deve-se reduzir o preço consignado na ata de registro de preços. Se os insumos e custos forem majorados, deve-se majorar o preço registrado. (…). De acordo com o supracitado artigo 17, a Administração deve manter equilibrada a ata de registro de preços do mesmo modo como mantém equilibrado o contrato administrativo. Os pressupostos materiais, formais e processuais são os mesmos.” (GUIMARÃES, Edgar; NIEBUHR, Joel de Menezes. Registro de preços: aspectos práticos e jurídicos. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2013. p. 103-104.) No mesmo sentido, Sidney Bittencourt escreve: “Considerando a instabilidade do mercado, o art. 17 converge para o reequilíbrio econômico-financeiro dos preços registrados na ARP, fazendo um paralelo com a famosa equação econômico-financeira constituída na relação que as partes inicialmente estabelecem quando da celebração de um contrato, objetivando a justa remuneração de seu objeto. Atendendo à chamada Teoria da Imprevisão, a rigor, sempre que comprovadamente, ocorra um desequilíbrio na relação inicialmente estabelecida entre os encargos e a retribuição financeira para a justa remuneração pela execução do objeto pretendido, é necessária a devida recomposição. Adverte-se, entretanto, que não é qualquer desequilíbrio que determinará a revisão, pois o contratado deve suportar alguns riscos inerentes à atividade econômica a que se entregou. Somente a denominada álea econômica extraordinária que autorizará o reequilíbrio, nunca a chamada álea ordinária. Essa máxima também é válida para os reequilíbrios das ARPs. Em resumo, reza o dispositivo que os preços registrados na ARP são passíveis de revisão quando de fato resultem num desequilíbrio econômico-financeiro devidamente comprovado, resultantes de situações imprevisíveis ou, mesmo que previsíveis, de consequências incalculáveis.” (BITTENCOURT, Sidney. Licitação de Registro de Preços. Comentários ao Decreto nº 7.892/2013, de 23 de janeiro de 2013, alterado pelos Decretos nºs 8.250, de maio de 2014 e 9.488, de 30 de agosto de 2018. 5. Ed. Belo Horizonte: Fórum: 2019, p. 136/140.) Por fim, Iúlian Miranda lembra que “As obrigações e os termos estabelecidos na Ata de Registro de Preços (ARP) obrigam tanto a Administração Pública quanto os licitantes, de modo que os direitos e deveres estabelecidos no edital de licitação para formação de uma ARP devem ser preservados, segundo as condições efetivas existentes à época da apresentação da proposta” (MIRANDA, Iúlian. Da revisão e do cancelamento dos preços registrados. In: FORTINI, Cristina (Coord.). Registro de Preços: análise crítica do Decreto Federal nº 7.892/13, com as alterações posteriores. 3. ed. rev., ampl. e atual. Belo Horizonte: Fórum, 2020, p. 201).
[11] Art. 65, inc. II, letra “d”: “para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual”.
[12]Com acerto, escreveu Rodrigo Azevedo: “Ora, os dispositivos acima, apesar de dizerem respeito a uma Ata de Registro de Preço e não a um Contrato Administrativo, ferem não apenas a disposição expressamente contida no inciso XXI do artigo 37 da Carta Magna, mas, também, o princípio da Isonomia e da Eficiência Administrativa. Se pode a Administração Pública reduzir os valores da contratação futura sempre que os preços registrados se tornarem superiores aos constatados no mercado, igual prerrogativa cabe aos particulares quando o inverso ocorrer, posto que a regulação contida na Constituição Federal fora o equilíbrio econômico financeiro do contrato e não a condição imperativa da Administração Pública na relação contratual.” (AZEVEDO, Rodrigo. Reequilíbrio Econômico Financeiro da Ata de Registro de Preço. Possibilidade ou Delírio?, disponível em https://rodrigoazevedoadvocacia.jusbrasil.com.br/artigos/195161016/reequilibrio-economico-financeiro-da-ata-de-registro-de-preco-possibilidade-ou-delirio, acesso em 18.1.2021.
[13] Propondo uma interpretação conforme à Constituição, Paulo Reis escreve que “Não podemos raciocinar com a hipótese de que o Decreto nº 7.892, de 2013, simplesmente veda qualquer elevação no preço registrado, pois estaríamos colocando esse regulamento em patamar hierárquico superior às Leis que regem as contratações públicas. Melhor será considerar que o Decreto foi, lamentavelmente, omisso. E que, diante dessa omissão, devemos buscar outros meios, no ordenamento jurídico, para fazer esse ajuste de valor a maior. Afinal, já ficou claro que o comando constitucional é direto, claro e objetivo: no curso da execução dos contratos devem ser mantidas as condições efetivas da proposta. Isto significa, deve ser mantido, sempre, o equilíbrio da equação econômico-financeira.” (REIS, Paulo Sérgio de Monteiro. Sistema de registro de preços: Uma forma inteligente de contratar – Teoria e Prática. [livro eletrônico]. Belo Horizonte, Fórum: 2020)
[14]Sem restringir às situações ocorridas na pandemia, valemo-nos do feliz exemplo dado por REIS: “Imaginemos que órgãos/entidades da administração pública tivessem registrados preços para fornecimento de máscaras cirúrgicas, constantemente demandadas em função das atividades desenvolvidas. Pouco tempo depois, em plena vigência da Ata, é decretada a pandemia gerada pelo novo corona vírus, que causa a doença denominada covid-19, com índices de propagação e de letalidade bastante elevados. Situação absolutamente imprevisível no momento em que a Ata foi formalizada. Como consequência da pandemia, os preços no mercado de comercialização de máscaras cirúrgicas sofreram consideráveis elevações, reação natural, considerando que, como regra, o aumento da demanda faz com que os valores correspondentes aumentem. Em uma situação como essa, seria natural que o gerenciador da Ata, convencido pelo fornecedor da impossibilidade de manutenção do preço registrado (fato confirmado, em seguida, pelos eventuais integrantes do cadastro de reserva), simplesmente o liberasse dos compromissos, declarando extinta a Ata? O que fazer a partir de então? Nova licitação? Uma contratação sem licitação? Com certeza, e os fatos estão aí para comprovar, em qualquer dessas ou de outras hipóteses legais, a administração se veria diante de um fato concreto: preços no mercado mito superiores aos que estavam registrados na Ata extinta. Valeria a pena, assim, extinguir a Ata? Ou, teria sido mais vantajoso, diante de uma situação absolutamente imprevisível, utilizar-se das disposições da Lei nº 8.666/1993, negociar com o detentor da Ata um aumento no preço registrado e continuar com um fornecedor de produto tão essencial?” (REIS, PauloSérgio de Monteiro. Sistema de registro de preços: Uma forma inteligente de contratar – Teoria e Prática. [livro eletrônico]. Belo Horizonte, Fórum: 2020).
[15] Nesse sentido, Iúlian Miranda: “Por isso o administrador deve ter boa-fé e ser razoável no momento em que o fornecedor fizer a solicitação, pleiteando a liberação do compromisso e/ou a revisão dos preços registrados. Conforme já exposto, não é de interesse da Administração Pública que os contratos administrativos levem o contratado à ruína” (MIRANDA, Iúlian. Da revisão e do cancelamento dos preços registrados. In: FORTINI, Cristina (Coord.). Registro de Preços: análise crítica do Decreto Federal nº 7.892/13, com as alterações posteriores. 3. ed. rev., ampl. e atual. Belo Horizonte: Fórum, 2020, p. 209).
[16] Em excelente e pioneiro artigo analisando a possibilidade de reequilíbrio de atas de registros de preços federais em decorrência de circunstâncias da pandemia COVID-19, Fabricio Motta e Victor Amorim concluíram que a) os atos normativos primários que dispõem sobre o sistema de registro de preços não veiculam o impedimento, a priori, de revisão da ata de registro de preços no sentido de promover a elevação dos preços registrados em razão de fatos supervenientes e circunstâncias excepcionais que alterem profundamente os valores praticados em mercado; b) qualquer entidade federativa em atendimento ao §3º do art. 15 da Lei nº 8.666/1993 poderia dispor sobre a possibilidade de alteração a maior de preços registrados em ata e c) a partir de uma análise sistêmica do regulamento federal do SRP e à luz dos princípios da eficiência e economicidade, é possível concluir pela possibilidade de elevação dos preços consignados em ARP formalizada com base no Decreto Federal nº 7.892/2013, em razão de fatos supervenientes e circunstâncias excepcionais que, comprovadamente, alterem os valores praticados em mercado como o caso da crise decorrente do coronavírus.
[17]Nesse sentido, ver FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby; FERNANDES, Murilo Jacoby; TEIXEIRA, Paulo Roberto; TORRES, Ronny Charles L. Direito provisório e a emergência do Coronavírus: ESPIN – COVID – 19: critérios e fundamentos: Direito Administrativo, Financeiro (Responsabilidade Fiscal), Trabalhista e Tributário: um mundo diferente após a COVID-19. Belo Horizonte: Fórum, 2020, p.102.
[18] Vide Acórdão nº 1431/2017 – TCU/Plenário.
[19] Vide Acórdão 12.460/2016-TCU – TCU/2ª Câmara.
[20] Atual art. 123, inc. II, letra “d”.
[21] Enunciado nº 175 do Conselho da Justiça Federal: “A menção à imprevisibilidade e à extraordinariedade, insertas no art. 478 do Código Civil, deve ser interpretada não somente em relação ao fato que gere o desequilíbrio, mas também em relação às consequências que ele produz.”
[22]A variação nos preços havida deve fugir à normalidade e acarretar um considerável desequilíbrio no contrato. Destarte, para que haja reequilíbrio econômico-financeiro, há que se comprovar inequivocamente que houve evento imprevisível, de consequências incalculáveis, devendo atentar, ainda, que o reequilíbrio deve estar lastreado em documentação que analise o seu custo global (Acórdão 1.466/2013 – TCU/Plenário).
[23] Orientações e jurisprudência do TCU / Tribunal de Contas da União. – 4. ed. rev., atual. e ampl. – Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência: Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010, p. 813.
[24] “Para o reconhecimento de seu direito, é fundamental que o solicitante demonstre o impacto econômico dos fatos – imprevisíveis ou previsíveis com consequências incalculáveis, por ele suscitados como geradores do direito ao reequilíbrio econômico-financeiro. Por outro lado, o gestor do contrato, no acompanhamento do pleito, deve analisar, comparando a variação do preço de mercado, se a justificativa é suficiente para o reequilíbrio econômico-financeiro em favor da Administração Pública ou do contratado. Quanto maior a demonstração desta variação extraordinária, mais confortável estará a outra parte contratante para concordar com o pleito de reequilíbrio econômico-financeiro. Voltando aos meios de prova, há que se admitir consulta a portais de preços públicos e privados, divulgados em meios eletrônicos. É óbvio ser conveniente a maior amplitude possível, inclusive com diversas fontes.” (FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby; FERNANDES, Murilo Jacoby; TEIXEIRA, Paulo Roberto; TORRES, Ronny Charles L. Direito provisório e a emergência do Coronavírus: ESPIN – COVID – 19: critérios e fundamentos: Direito Administrativo, Financeiro (Responsabilidade Fiscal), Trabalhista e Tributário: um mundo diferente após a COVID-19. Belo Horizonte: Fórum, 2020, p. 100/102.)